domingo, 14 de dezembro de 2014

OGM - Bioética Ambiental e os princípios éticos do cuidado e da proteção em relação aos Organismos Geneticamente Modificados

Por Gabriela Rodrigues, Juliana Zacarkin dos Santos e Renata Bicudo Molinari

Ensaio desenvolvido para o blog Etologia no dia-a-dia


Segundo estudo de Gilles-Eric Seralini [OGM], da Universidade de Caen, na França, publicado pela revista Food and Chemical Toxicology, fêmeas de ratos tratadas com alimentos transgênicos como milho morriam com uma frequência de duas ou três vezes maior e tinham até três vezes mais chances de desenvolverem câncer, isso tanto em macho como em fêmeas. Uma instituição francesa rejeitou o estudo e pediu um estudo independente. Porém, esse primeiro estudo já deveria nos alertar sobre a possibilidade de riscos para o uso indiscriminado de organismos geneticamente modificados. Mesmo assim, no Brasil, o Ministério da Agricultura aprovou a introdução de 12 espécies de milho híbrido com a tecnologia Roundup, a mesma que causou a morte e o câncer nos ratinhos do estudo Seralini. Além do milho, muitos outros organismos geneticamente modificados vêm sendo introduzidos e desenvolvidos no Brasil mesmo sem saber quais são os riscos a longo prazo.
Organismos geneticamente modificados ou OGM são aqueles que tiveram seu material genético (DNA/RNA) alterado por meio de qualquer técnica de engenharia genética, de uma maneira que não ocorreria naturalmente. Essas alterações genéticas envolvem uma séria questão ética, já que não sabemos ao certo os efeitos que os transgênicos podem causar em nosso organismo a longo prazo e diante a estudos que mostram que existe a tendência de surgimento de câncer em ratos quando submetidos aos alimentos com OGM. Outra questão ética atualmente discutida em relação ao tema é que alimentos transgênicos podem causar perda de diversidade já que competem com espécies nativas por serem mais resistentes ao clima e às pragas.
As normas legais e morais tradicionalmente adotadas por nossa sociedade – já não conseguem resolver as questões éticas levantadas acima por serem problemas globais e muito polêmicos, exigindo a intervenção da Bioética para promover a mediação das diferentes opiniões acerca da questão e ajudar a achar soluções viáveis e que satisfaçam as necessidades dos diversos envolvidos e interessados no assunto, como consumidores, pesquisadores e produtores, assim como, proteger o meio ambiente dos impactos que os OGMs podem gerar.
Devido cerca de 77% dos transgênicos atualmente desenvolvidos serem modificados para serem resistentes à herbicidas, os agricultores podem usar bem mais agrotóxicos para matarem ervas daninhas e todas as outras plantas que não lhes interessam economicamente sem afetar a lavoura. Além disso, existem os organismos Bt, que correspondem à 15% dos OGMs produzidos no mundo atualmente. Os Bt possuem modificações genéticas que produzem toxinas próprias para matar determinados insetos considerados pragas, como, por exemplo, a lagarta do cartucho. O restante são OGMs que possuem as duas características simultaneamente no mesmo produto.
Essas alterações diminuem os riscos de danos ou perda de lavoura, diminuindo os gastos e aumentando o lucro do produtor, apesar de estudos apontarem que a produtividade de soja transgênica geralmente é menor do que das variedades convencionais. A Lei 11.105 de 24 de março de 2005: Regulamenta os incisos II, IV e V do § 1o do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS em seu Art. 1o Esta Lei estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização sobre a construção, o cultivo, a produção, a manipulação, o transporte, a transferência, a importação, a exportação, o armazenamento, a pesquisa, a comercialização, o consumo, a liberação no meio ambiente e o descarte de organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, tendo como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal, e a observância do princípio da precaução para a proteção do meio ambiente.
Entre os pesquisadores há os que defendem os benefícios dos OGM, assim como e há também os que alertam sobre os impactos e riscos. Aqueles que defendem sua utilização, afirmam que a biotecnologia diminui os impactos do homem sobre a natureza e que as lavouras transgênicas, além de serem seguras para o meio ambiente, oferecem benefícios em relação às convencionais no que diz respeito à preservação do planeta: menos agrotóxicos; menor gasto de água; aumento da produção e também já estão sendo testadas plantas transgênicas capazes de despoluir o solo e a água.
            Animais utilizados na pesquisa são vulneráveis e expostos a alimentação com transgênicos o que que lhes causam males como câncer e problemas no trato reprodutivo e sistema hormonal. Seres humanos e demais animais que se alimentaram de OGM são considerados indivíduos vulneráveis por, muitas vezes consumirem alimentos e produtos transgênico sem estarem cientes já que, nem sempre há a informação de que os alimentos contêm transgênicos em seu processo de fabricação ou em sua composição.            Podemos considerar, por tanto, que a natureza como um todo é vulnerável. Pois os organismos geneticamente modificados causam um desequilíbrio na cadeia alimentar, uma vez que tendem a ser mais resistentes do que as espécies nativas podendo gerar perda de biodiversidade e contaminando animais que se alimentam ou polinizam geneticamente modificadas e isso pode causar alterações genéticas em todos os organismos.
           
A proteção é o âmago da ética, que percebe a vida como algo vulnerável e que a natureza tem sua resiliência superada, uma vez que o homem não percebe que suas intervenções políticas e socioeconômicas interferem profundamente. Não se trata apenas da vulnerabilidade da natureza, nem de defendê-la em prol do ser humano. Mas a natureza por seu valor intrínseco, na qual Potter, chama a atenção quando remete ao Principio da Vulnerabilidade. O maior nível de consciência a respeito da importância do ambiente e do seu valor, e a possível intervenção do homem para as gerações futuras, nos fazem questionar as possíveis implicações dessa nova tecnologia, cujas alterações no ambiente e riscos à saúde não são totalmente conhecidas.  É necessário avaliar os riscos desses alimentos para as gerações futuras, Hans Jonas prima por esse cuidado e prudência quando nos apresenta o Principio da Responsabilidade, alertando-nos sobre as novas ações da civilização tecnológica. Cria um novo imperativo em substituição ao imperativo Kantiano: age de tal maneira que os efeitos de tua ação sejam compatíveis com a existência humana. Pois para Jonas, a natureza que antes cuidava de si mesma, agora passa a manter com o homem uma relação de responsabilidade. É preciso abandonar a Ética Antropocêntrica. Leonardo Boff, também alerta para a ética do cuidado, uma ética de virtudes que sustente atitudes e formas de caráter que sustentem a conscientização ecológica e cultural sobre a transformação da sensibilidade pela vida. Ainda sobre o cuidado, foi formulado o princípio da precaução, primeiramente pelos gregos, relacionando-o ao respeito do homem para com a natureza. O Princípio da Precaução rege a lei de Biossegurança, e é mencionado nos artigos 10 e 11 do Protocolo de Cartagena  como: "a ausência de certeza científica devida à insuficiência das informações e dos conhecimentos científicos relevantes sobre a dimensão dos efeitos adversos potenciais de um organismo vivo modificado na conservação e no uso sustentável da diversidade biológica na Parte importadora, levando também em conta os riscos para a saúde humana...”. Conforme verificado, o Principio da Precaução deve ser utilizado como regra geral em situações onde existam ameaças sérias e irreversíveis à saúde e ao meio ambiente. Um decreto federal regulamentou em 2003 o direito à informação quanto à natureza transgênica dos alimentos comercializados. Caso a quantidade de transgênicos seja superior a 1%, a indústria alimentícia deve informar aos consumidores por meio dos rótulos. Além do símbolo (letra T inserida em um triângulo amarelo), o rótulo também deve informar os ingredientes geneticamente modificados.   
Nós como futuras bioeticistas acreditamos que para que o princípio do cuidado seja aplicado, o consumidor tem o direito de ser informado através de etiquetas, que determinado produto é transgênico ou possui em sua cadeia produtiva algum tipo de transgênico, cabendo ao consumidor decidir se quer adquiri-lo ou não.  Quanto ao uso dessas tecnologias, é necessário estudos que avaliem os riscos, cabendo também as instituições públicas, uma orientação das pesquisas científicas antes da liberação desses produtos. Assim respeitando a proteção de toda e qualquer forma de vida envolvida na cadeia produtiva dos OGM’s.

           

Este Ensaio foi elaborado para disciplina de Disciplina: Fundamentos de Bioética -  Programa de Mestrado em Bioética da PUCPR, tendo como base as obras:

BOFF, Leonardo. Saber Cuidar , ética do humano - compaixão pela terra. Curitiba: Editora Vozes. 1999


DECRETO N 4.680 - Regulamenta o direito à informação, assegurado pela Lei no
 8.078, de 11 de setembro de 1990, quanto aos alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados, sem prejuízo do cumprimento das demais normas aplicáveis.
JONAS, Hans. Princípio Responsabilidade. Rio de Janeiro: Contrapondo: PUC- Rio, 2006. 354p.

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